[Diário de Bordo] O meu autismo no NOS Primavera Sound 2016

Olá olá, bem sei que estou um bocadinho atrasada para escrever sobre o NOS Primavera Sound, mas foi chegar a Lisboa e ter exames para vigiar e corrigir, uma série de contratempos pessoais e profissionais, mas nada a que não se sobreviva para contar. E a partir daqui apenas falarei do NOS Primavera Sound 2016 e do orgulho que foi ver os portugueses a darem concertos bem melhores que outros grandes nomes e de como Sigur Rós, Savages, Protomartyr, Car Seat Headrest, Explosions in The Sky e Moderat fizeram o meu festival no que toca a bandas internacionais.

Mas comecemos pelo que é nacional, ou seja, pelos Sensible Soccers, White Haus e Linda Martini, em que os dois primeiros abriram o palco Super Bock nos dias 9 e 10 e os últimos o palco NOS no dia 11.

Sensible Soccers

Cheguei um pouco antes das 17h e, sendo o primeiro dia, não pude deixar de ficar surpreendida com a quantidade de gente já pronta para os ver. Ao início mais tímidos, sentados na relva, entretanto de pé e a dançar. Confesso, ver Sensible Soccers em ambiente de festival não é o meu formato preferido, mas o facto de Vila Soledad, o disco que têm andado a apresentar pelo país, ser mais electrónico que o anterior, ajuda a que haja uma maior envolvente entre banda e público. O espectro musical sendo mais alargado, também não dispensa os tons orgânicos da guitarra e do baixo, que complementam a atmosfera sublime e psicadélica que é muitas vezes gerada. Para meu deleite e de tantos outros, a AFG, tema que nos conquistou no disco anterior, também não faltou. E lá está, não há como resistir aos sorrisos e cumplicidade trocados em palco, à forma carinhosa como a banda trata sempre os seus fãs. Tivessem tocado à noite e de certeza que iriam ter público cheio e reacções ainda mais emotivas.

White Haus

Este é projecto que muito pouco tem a provar. Já os vi umas quantas vezes ao vivo e o à vontade, a confiança e a provocação em palco assenta-lhes lindamente. Neste concerto tiveram a estreia de João Doce na percussão, e mesmo sendo provocado várias vezes pelos colegas por um potencial nervosismo, saiu-se lindamente. Já todos o conhecemos de tocar com o Tó Trips, e vê-lo neste contexto mais electrónico em nada lhe fica mal, pelo contrário, a sua energia é um bom complemento ao quarteto habitual White Haus. João Vieira, a cara do projecto, mostra uma experiência notável ao animar um público que costuma ser claramente noturno. Calhou um sol radiante e uma luz quentinha, mas qualquer hora é boa para dançar e, perdoem-me o à parte, existem poucas artistas mais sensuais do que a Graciela em palco. Juntamos a segunda dose de NOS Primavera Sound do André Simão e não podemos não ficar com a impressão que aquele palco era apenas mais uma casa para este conjunto de artistas.

Linda Martini

São a banda portuguesa que mais vezes vi ao vivo. São também a banda portuguesa que sigo há mais anos, ainda era eu uma adolescente meia perdida (será que alguma vez nos encontramos verdadeiramente?). Talvez por isso tenha sentido este último concerto mais morno. Sirumba é um disco que, sendo recente, ainda não aqueceu as gargantas dos seus fãs e isso nota-se claramente quando são tocadas músicas mais antigas, em que a exaltação se faz notar de sobremaneira e as letras estão na ponta da língua. É claro que já se tornaram numa banda de culto, com mais de 10 anos de existência é o palco principal que abrem, já em Paredes de Coura foi assim (um dos melhores concertos que vi deles, se não o melhor), e é-lhes reconhecida a excelência de quem faz o que faz por gosto, a seu tempo e com a devida segurança e confiança. Não faltou o crowdsurfing final de Geraldes e Hélio, que careceu na apresentação no Coliseu de Lisboa, e o concerto fechou-se como sempre, em festa.

Explosions in the Sky

Sigur Rós, Savages, Protomartyr, Car Seat Headrest, Explosions in The Sky e Moderat

Podia mencionar muitos outros nomes por aqui, mas a verdade é que se não o faço foi porque ou me desiludiram ou me foram completamente indiferentes. Eu sei que nos festivais a probabilidade de uma banda de quem gostamos nos desiludir é grande, afinal os concertos em festivais são sempre voláteis, muito dependentes também de quem nos rodeia, e daí o título deste post. Andei armada em autista na grande maioria do NOS Primavera Sound. Tinha dezenas de amigos espalhados pelo festival, mas não seria raro ou de estranhar ver-me afastada, ou só com uma ou duas pessoas, num qualquer posicionamento mais estratégico para ver determinado concerto. Agora que penso nisso, tive apenas três pessoas que, intercaladas, me foram acompanhando (ou que eu acompanhei) nesta selecção de concertos que não queria perder.

Comecemos com Sigur Rós, logo no primeiro dia. Quando li os relatos pelas redes sociais (que começo a abominar cada vez mais) rapidamente percebi que todos pareciam ter estado em concertos completamente diferentes. Eu, muito bem acompanhada pela Melissa e pelo Bernardo, estivemos muito bem posicionados, perto do palco numa zona central, e soubemos aquietar e silenciar o pouco povo que decidia abrir a boca durante o concerto. Uma banda como Sigur Rós não pede um concerto ao ar livre, mas eles souberam como compensar enchendo o palco de uma artilharia material e de luz proeminentes. Foi dos concertos que mais mexeu comigo, mas também foi a primeira vez que os vi ao vivo. Sei que faltava pelo menos o teclista em palco, mas mais uma vez não senti o palco vazio ou sequer falta de energia a vir de lá. Pelo contrário, o vocalista de alguma maneira esmerou-se e ultrapassou o seu habitual recolhimento para chegar mesmo a provocar o público em alguns momentos da actuação.

Protomartyr e Car Seat Headrest foram duas bandas que conheci graças ao João Pedrosa. Tanto me provocou que lá o segui e a verdade é que ele tinha mesmo razão. Foram dois concertos do caraças, ambos no palco Pitchfork. Fiquei surpreendida, principalmente com os segundos, por terem tanto público à sua espera. Melhor, sabiam as letras e os Car Seat Headrest chegaram mesmo a dizer que Barcelona podia ter tido o dobro do público, mas que no Porto eram o dobro no entusiasmo e no feedback que se fez sentir. Aqui ficam duas bandas anotadas para atenção futura.

Mas não nos adiantemos demasiado porque ainda me faltam as Savages no segundo dia que mais uma vez deram um concertão. Não sei bem de que material são feitas aquelas três mulheres, mas só conseguia pensar que quem me dera andar com elas na estrada, conhecer as suas histórias e de como se tornaram esta máquina bem oleada que, por mais vezes que as veja ao vivo, nunca me desiludiram. A vocalista ainda defendeu uma eventual prestação menor, alegando que se aleijou nas costas recentemente, mas qual quê. Atirou-se ao público e deu o que tinha a dar e nós só podemos ficar gratos por tamanha entrega. Nos dias de hoje a distância entre o palco e o público parece ser formada por uma qualquer camada fina de gelo, mas neste concerto a única coisa que se sentiu foi um fogo capaz de domar qualquer um. Claro que uma das consequências foi depois não ter conseguido ficar muito tempo no concerto de PJ Harvey que não foi muito mais do que uma encenação. O facto de nem numa guitarra ter pegado mostra que os seus dias dourados já passaram, fica aquela ligação ao seu eu mais antigo.

Moderat

Último dia do NOS Primavera Sound e depois de Linda Martini e de Car Seat Headrest, veio a espera de hora e meia na grande do palco Super Bock para ver Explosions in The Sky. Sim, aconteceu. Não me lembro de alguma vez o ter feito, nem quando era miúda e comecei a ir aos festivais. Mas aos 28 anos, e depois de ter perdido algumas oportunidades de os ver, tal aconteceu. E este é outro concerto que causa alguma discordância entre quem o viu, mas que a mim pareceu-me só do melhor que já vi. Mas eu sou suspeita. Sou daquelas pessoas em que a Your Hand in Mine foi banda sonora de umas das separações mais difíceis da minha vida, que tantas outras músicas foram o bálsamo para inúmeras e diversas situações ao longo dos últimos dez anos.

Por fim, Moderat. Para quem não conhece, Moderat é o projecto de Sascha Ring, Apparat, com os membros de Modeselektor. Conheci Apparat há cerca de oito ou nove anos e ainda só tinha tido a oportunidade de ver o Sascha a solo no Super Bock Super Rock em 2012. Na altura tocou a Rusty Nails e uma ou outra do projecto com Moderat, mas só agora no NOS Primavera Sound é que pude testemunhar o poderio deste trio. III, o último disco de Moderat, tem sido um vício constante – acho que qualquer dia chego ao carro e o disco já não toca por exaustão. Sendo o último concerto do NOS Primavera Sound no palco principal, tive algum receio que os três não fossem suficientes para entusiasmar o público, mas pelo que pude testemunhar saíram de lá com bem mais fãs do que com que entraram. O concerto contou com um espectáculo de luzes e de imagens forte, não faltou a abordagem mais orgânica à guitarra e ao baixo, o Sascha é uma caixinha de surpresas, e se tinha medo de ficar desiludida, a verdade é que saí de lá com um bruto sorriso nos lábios.

Ambiente

Abençoado NOS Primavera Sound e o reforço das casas de banho. Não encontrei uma única fila o festival inteiro. A zona da restauração foi reforçada com novas instalações sanitárias e a própria oferta alimentar era variada o suficiente para não me ter deparado também com grandes filas para comer. Não há como não gostar do recinto. O Parque da Cidade do Porto é dos sítios mais bonitos do nosso país e dada a disposição dos palcos tanto podemos desfrutar de um concerto sentados, como de pé e podemos circular sem andarmos aos tropeções e aos encontrões. Não vou cair naquela mania de falar do tipo de público que frequentou o festival, talvez porque andei os três dias muito abstraída disso mesmo. Acho que cada vez mais os concertos e os festivais, se quisermos tirar alguma coisa deles, tem de ser uma experiência pessoal. Só saquei do telemóvel para uma ou outra fotografia no final dos concertos que mais me marcaram e nem foi em todos. Ou seja, quis viver e sentir sem ter de me preocupar com isto ou aquilo ou aquele ou o outro. Daí a falta de fotografias neste post, mas basta irem ao Facebook do NOS Primavera Sound e por lá não faltarão, com certeza, fotografias de tudo e mais alguma coisa. Mais uma excelente experiência num dos únicos festivais dos quais ainda tiro um prazer genuíno. 

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    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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