Opinião: A Célula Adormecida, de Nuno Nepomuceno

A Célula Adormecida

Nuno Nepomuceno

Editora: Topbooks

Sinopse: Em plena noite eleitoral, o novo primeiro-ministro português é encontrado morto. Ao mesmo tempo, em Istambul, na Turquia, uma reputada jornalista vive uma experiência transcendente. E em Lisboa, o pânico instala-se quando um autocarro é feito refém no centro da cidade. O autoproclamado Estado Islâmico reivindica o ataque e mostra toda a sua força com uma mensagem arrepiante. O país desperta para o terror e o medo cresce na sociedade. Um grande evento de dimensão mundial aproxima-se e há claros indícios de que uma célula terrorista se encontra entre nós. Todas as pistas são importantes para o SIS, sobretudo, quando Afonso Catalão, um conhecido especialista em Ciência Política e Estudos Orientais, é implicado. De antecedentes obscuros, o professor vê-se subitamente envolvido numa estranha sucessão de acontecimentos. E eis que uma modesta família muçulmana refugiada em Portugal surge em cena. A luta contra o tempo começa e a Afonso só é dada uma hipótese para se ilibar: confrontar o passado e reviver o amor por uma mulher que já antes o conduziu ao limiar da própria destruição. Com uma escrita elegante e o seu já tão característico estilo intimista e sofisticado, inspirado em acontecimentos verídicos, Nuno Nepomuceno dá-nos a conhecer A Célula Adormecida. Passado durante os 30 dias do mês do Ramadão, este é um romance contemporâneo, onde ficção e realidade se confundem num estranho mundo novo e aterrador que a todos nos perturba. Um thriller psicológico de leitura compulsiva, inquietante, negro e inquestionavelmente atual.

Opinião: Mas. Que. Livro.!Eu sei que não devia estar tão espantada, afinal conheço o Nuno e tenho real noção do seu talento, mas tenho que admitir que superou qualquer expectativa que eu pudesse ter. Não menosprezando a Trilogia Freelancer, A Célula Adormecida está noutro patamar. Se por um lado o volume do livro pode assustar, afinal são quase 600 páginas, por outro lado não lhe adicionava nem tirava uma página que fosse. Quando encontrei o último ponto final, senti que estava perante um livro assombroso, um dos melhores livros da actualidade, sem sombra de dúvidas. Não me custa sequer imaginar que, mais cedo ou mais tarde, se tornará numa autêntica referência no que diz respeito a policiais/thrillers/romances(gerais) relacionados com terrorismo, mais propriamente com o auto-proclamado Estado Islâmico. A quantidade de informação, nunca sendo demasiada, está perfeitamente equilibrada. Cada ingrediente é dado no momento certo e, terminada a leitura, sinto-me uma pessoa muito mais culta, muito mais conhecedora de um tema tão actual e que é alvo de tanta desinformação.

Como vocês sabem, principalmente por ter apresentado os últimos dois livros dele, o Nuno Nepomuceno, mais do que um autor, tornou-se um amigo. E ler o livro de um amigo é sempre um momento de responsabilidade, a sinceridade torna-se ainda mais vital, daí a necessidade de nos afastarmos desse papel e pegarmos na obra como se de um desconhecido se tratasse. E a verdade é que parecia que estava mesmo a ler um livro de um autor que nunca tinha lido. Houve uma espécie de emancipação na maturidade da escrita, muito sóbria, muito sólida, muito dura. A sensibilidade que era tão característica na Trilogia Freelancer transformou-se em algo maior, num pesar bem articulado e factual. Também o formato da narrativa mudou um pouco, com capítulos mais rápidos, vários protagonistas em paralelo que são determinantes para o rumo final da história e mais não digo, para não estragar ou fazer prever algo sobre a leitura.

Não quero falar sobre a história em si. A sinopse diz quanto baste e acho que o essencial a retirar desta leitura é que a minha admiração pela postura deste livro não tem fim. É completamente despretensioso, ao mesmo tempo que é uma lufada de ar fresco necessária. São poucos os livros deste género que se dão ao trabalho de educar o leitor, de fazer questão de elucidar, com pormenor quanto baste, as idiossincrasias que rodeiam o enredo. Muito se fala sobre muçulmanos, radicais, as guerras do médio oriente, os potenciais interesses económicos das principais potencias mundiais, mas pouco se mergulha no que realmente significa ser muçulmano, na crença em Maomé e pelo que é regido o Alcorão. Este livro é precioso em vários sentidos, mas este é um dos principais, principalmente pelas consequências que vamos testemunhando no que toca ao preconceito, à total ignorância consciente, pois é mais fácil colocar as culpas no que se desconhece do que tentar-se conhecer e compreender a diferença. 

Tenho tido mesmo muito pouco tempo para ler, mas a minha relação com o livro tornou-se algo dependente. Dei por mim sem me aperceber das horas a passarem, a parar só para comer, e mesmo tendo tanta coisa da faculdade por completar, não resisti em fazer uma pequena maratona para não acabar o fim-de-semana sem o ler. Gostei muito da desenvoltura da história, da mistura de uns quantos géneros, perfeitamente alinhados, de forma a proporcionar ao leitor uma leitura ritmada, apaixonada, expectante e surpreendente. São várias as questões que levantamos sobre a trama ao longo da mesma, são vários os momentos em que sorrimos, outros em que o coração se aperta e outros em que tudo se torna tão negro que houve momentos em que ceguei, de sentir uma revolta tão pura por saber que aquilo acontece na vida real. Lisboa foi o palco escolhido para a ficção, mas podia não ser ficção, em muitas cidades é exactamente aquilo que tem acontecido. E a conclusão é que a incompreensão leva ao ódio e o ódio ao imprevisível. Uma pessoa é capaz de se transformar por completo e ser autor de acções que nunca antes teria sido capaz sequer de se imaginar pensá-las. Gostei. Muito. Na verdade, acho que, A Célula Adormecida, é um grande candidato a livro do ano. 

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    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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