[Diário de Bordo] Porque os alunos de doutoramento não têm férias

Adoro as épocas festivas. Seja Páscoa, Natal, Carnaval, o que for, não fosse o constante alarido que se fazem sobre as mesmas e eu quase não dava por elas. Aliás, cometi a gafe de só ontem ou antes de ontem dar conta que esta semana os meus alunos estavam de férias e que hoje não precisava de me levantar às 6h da manhã. Os alunos entram de férias, mas não são todos os alunos e muito menos os de doutoramento. 

Como se já tivesse pouca coisa em mãos, faz hoje quatro semanas que decidi organizar um grupo de encontro de alunos de doutoramento aqui do edifício. Nada de professores nem de investigadores seniores. Só alunos que pretendam dizer o que lhes vai na alma, mandar umas caralhadas cá para fora (desculpem os mais sensíveis) e descontrair um pouco. Ao mesmo tempo, a cada sessão cada um vai falando sobre o que anda a fazer e vai descobrindo que afinal não sabe falar assim tão bem sobre o que anda a fazer, eu incluída. 

É que nisto da engenharia informática há N vertentes diferentes e se ainda almejarmos a ter aplicações biológicas ou sociais a coisa torna-se mais delicada. O discurso tem de ser transversal e perceptível seja qual for a audiência. Como no nosso grupo temos gentes de backgrounds completamente diferentes, este mostrou-se um dos maiores e melhores desafios dentro do grupo: conseguir explicar o que estamos a fazer e as suas aplicações de forma a que todos entendam. E o melhor de tudo é que fazemos isto, falar ou ouvir, sempre com lanchinho, café ou chá. Temos tido a sorte de, tirando no primeiro dia em que remediámos com pasteis de nata quentinhos, haver sempre alguém que faça algo caseiro. 

Confesso que é uma das minhas horas preferidas da semana toda. Quando comecei a fazer o meu doutoramento tive imensas crises existenciais. Quis desistir, andei perdida sem saber o que fazer, sentia-me sozinha e meia sem propósito. Felizmente a coisa lá se endireitou há coisa de dois anos, muito posso agradecer à paciência dos meus orientadores, e já estou no quarto ano e com perspectivas de entregar a tese final até Dezembro. 

No entanto, nos últimos meses andava-me a cruzar com malta a começar o seu doutoramento, ou no final do primeiro ou segundo ano, e a desabafar que não sabiam bem o que andavam a fazer nem como falar sobre isso. Oh! Como me identifiquei com esse sentimento! Foi aí que decidi que estava na altura de tentar de ajudar a malta a encontrarem algumas pessoas, ou pelo menos uma hora por semana, em que pudessem conferenciar e falar sobre possíveis problemas que estivessem a passar. Quis também que saíssem da sua zona de conforto e desafiei-os a, a cada semana, cada um apresentar a temática em que está a trabalhar. 

O resultado, parece-me, tem sido muito positivo. O facto de não haver a pressão ou a obrigação do politicamente correcto na presença dos “maiores” faz com que a malta tenha mais confiança para arriscar. Melhor ainda, o espírito crítico construtivo tem sido incrível. Quem me dera que esta “terapia de grupo” já existisse, com um grupo tão porreiro como este que se está a criar, quando comecei o meu doutoramento. Se por acaso estão a fazer um doutoramento e nosso instituto ou centro de investigação não têm um grupo destes criem-no. A sério. Consegue ser duro e ficamos nervosos e claro que nos expomos, mas acho que há muito mais a ganhar do que a perder. Ao início éramos meia dúzia de gatos pingados, agora já somos quase vinte. 

Tudo isto para dizer que os alunos de doutoramento não têm férias. Há sempre coisas a fazer, a discutir, toda uma vida académica para fazer acontecer e parece nunca haver tempo suficiente para tal. Ainda assim, nestes pequenos momentos, tudo parece ter um propósito e valer a pena. Resumindo e concluindo: ando ocupada, como sempre, com tudo atrasado, como sempre, mas está tudo bem. Tenho conseguido ir ao ginásio pelo menos três vezes por semana (45m a 1h de treino), lá dou as minhas aulas, lá tento não desesperar com a pilha de livros por ler e estou prestes a defender a minha proposta de tese. Pelo meio ainda vou dar uma palestra ao Instituto de Medicina Molecular esta semana. Espero que desse lado também esteja tudo bem convosco. Obrigada por me continuarem a acompanhar e não percam as estreias e novidades que vou divulgando por aqui! Abreijos 🙂 

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    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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